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Cidade para mulheres: uma análise do relatório “Safe Cities and Safe Public Spaces” do programa ONU Mulheres

publicado em 25/07/2024 14:41

Fonte: a.urbe

As cidades ao redor do mundo são seguras para as mulheres?

Basta ser mulher em qualquer lugar do mundo para, ao responder esta questão, relembrar a sensação de insegurança ao caminhar por uma rua escura, ou mesmo ao enfrentar um transporte público lotado e se sentir extremamente vulnerável à violência e ao assédio.

O relatório "De quem é a cidade? Uma avaliação da segurança urbana para mulheres em 10 países", desenvolvido pela ActionAid em 2017[1], por exemplo, revela que as mulheres estão constantemente sob a ameaça de violência, assédio e intimidação ao redor do mundo.

Em razão deste problema que assola o mundo todo, o programa “Safe Cities and Safe Public Spaces” da ONU Mulheres fomenta o desenvolvimento de iniciativas locais de direitos humanos no combate à violência contra mulheres e meninas, além de apoiar a participação das mulheres na política e o desenvolvimento de ferramentas que garantam a autonomia e a independência economica.

Em 2017, o programa apresentou um relatório[2] contendo exemplos específicos de soluções, muito interessantes, adotadas por cidades ao redor do mundo no enfrentamento ao assédio sexual e outras formas de violência contra mulheres em espaços públicos.

A intenção do relatório foi enaltecer as medidas adotadas pelas cidades citadas e inspirar outros locais do mundo a desenvolverem ações semelhantes.

Ho Chi Minh – Vietnam:

Foi criado o programa “Ho Chi Minh, cidade segura e amigável e espaços públicos para Mulheres, Jovens e Crianças.” O programa envolve uma parceria entre a ONU Mulheres e o Departamento de Trabalho e Assuntos Sociais local.

Através de criterioso diagnóstico realizado após consulta às mulheres da cidade, restou evidenciada a extensão e a natureza do assédio sexual e outras formas de violência sexual contra mulheres nos espaços públicos, incluindo ruas, transporte público e banheiros públicos e em espaços privados como piscinas, universidades, escolas, bares, salas de cinema e academias.

O estudo deu início a uma série de ações concretas, com destinação específica de recursos públicos, no combate à violência de gênero.

Cape Town – África do Sul:

As autoridades locais realizaram um estudo abrangente sobre questões relacionadas ao assédio e violência contra as mulheres, incluindo uma avaliação sobre a segurança urbana.

O estudo envolveu mulheres e planejadores urbanos em dois worshops inovadores. Usando o “space design thinking”, eles construíram uma compreensão compartilhada dos problemas enfrentados por mulheres e meninas e ajudaram a formular ações para o desenvolvimento urbano, especialmente focadas no deslocamento seguro.

Dublin – Irlanda:

Em Dublin foram realizados estudos que indicaram que os problemas de  desenho urbano são uma das principais razões para o medo das mulheres no acesso a espaços públicos, especialmente em áreas sem cuidado, sujas, hostis e com paredes que obstruem a visão das pessoas.

Rabat – Marrocos:

A pesquisa realizada em Rabat indicou dados alarmantes: 92% das mulheres disseram que tinham experimentado alguma forma de assédio sexual durante a sua vida e a maioria dos homens disse que, pelo menos uma vez em sua vida, assediou mulheres em espaços públicos.

Entre outras medidas, o estudo levou à criação da “Entidade de Equidade, Igualdade de Oportunidades e Abordagem de Gênero”, um mecanismo local para garantir que as questões de gênero sejam consideradas em todas as decisões da cidade.

Cidade do México – México:

Os estudos realizados na Cidade do México indicaram que a maioria das mulheres participantes tinha experimentado alguma forma de violência sexual em seu trajeto diário e que 3/4 das mulheres utilizavam o transporte público diariamente.

Diante disso, o governo da Cidade do México aumentou sua frota de ônibus destinada, exclusivamente, para mulheres.

Foram instalados novos centros de suporte no sistema de metrô para as mulheres relatarem incidentes de assédio sexual e outras formas de violência sexual, além de proporcionar apoio emocional e psicológico e ajuda-las na busca de justiça.

Além disso, foi criado um aplicativo para celular que facilita a comunicação de incidentes relacionados à violência contra mulheres.

A Cidade do México inspirou outros município do país a alocar recursos para implantar medidas para garantir a segurança das mulheres em espaços públicos.

Winnipeg – Canadá

No Canadá, a cidade de Winnipeg foi pioneira ao criar um programa específico de segurança para as mulheres nos espaços públicos. Sob a liderança do Secretariado da Mulher, vários parceiros colaboraram com a iniciativa –profissionais da saúde, formuladores e aplicadores de leis, sociedade civil e instituições comprometida com os direitos das mulheres.

Também foi desenvolvido o primeiro programa liderado por indígenas para mulheres que passaram por algum tipo de violência sexual.

Novas iniciativas de segurança no transporte público foram desenvolvidas e estão em vigor.

Além disso, frequentemente são realizados workshops para conscientização e educação de homens.

Quito – Equador:

Foi realizado um estudo, no ano de 2011, que constatou que 68% das mulheres tinham sofrido alguma violência sexual no transporte público. Além do mais, 84% das mulheres entrevistadas classificaram o transporte público como inseguro.

Como primeiro passo, a cidade alterou uma lei local para reforçar as ações contra o assédio sexual em espaços públicos. A nova legislação, combinada com as evidências do estudo, ajudou a desenvolver o “Plano Quito Cidade Segura para Mulheres”, o qual foi incluído dentro de uma “categoria especial” com dotação orçamentária específica.

Uma abordagem de gênero foi introduzida nos transportes municipais, incluindo a remodelação de 43 dos 44 pontos de transporte público de acordo com novos critérios de segurança, incluindo a construção de corredores de vidro transparente nas zonas de transferência e de espera.

Na Empresa Metropolitana de Transportes de Passageiros de Passageiros, 600 membros receberam formação para ajudar mulheres que enfrentaram o assédio e outras formas de violência sexual.

Foram implementados serviços de atendimento em cinco das principais estações de transporte metropolitano, conhecidas como “Bájale al acoso”, para recebimento de denúncias de assédio sexual e apoio às mulheres.

Foi desenvolvido, ainda, um aplicativo de celular permitindo que as mulheres possam denunciar - de forma segura e imediata - casos de assédio sexual através de mensagens de texto. Centenas de casos foram recebidos, tendo alguns sido encaminhados para ação no âmbito do sistema judicial.

O observatório municipal da criminalidade, que monitoriza tendências do crime e da violência na cidade, foi ampliado para a coleta rotineira de dados sobre violência sexual e outras formas de violência em espaços públicos.

Além disso, foi desenvolvida uma campanha de comunicação para prevenção de violência nas escolas.

Quezon City – Filipinas

Em 2015, foi aprovada uma legislação local inovadora e específica estabelecendo sanções para o assédio sexual em espaços públicos.

Foi implementado um processo de capacitação de mulheres, grupos comunitários, administração local e funcionários da segurança.

A cidade de Quezon foi amplamente consultada no âmbito das reformas legislativas nacionais e liderou um esforço para incentivar medidas semelhantes à sua lei de 2015 em 16 municípios da região metropolitana de Manila.

A tecnologia também está contribuindo para expandir o alcance popular do programa em Quezon. 56 hackers experientes foram mobilizados para usarem “os seus poderes para o bem”, ou seja, para criarem soluções inovadoras de tecnologia móvel para o assédio sexual e a violência contra mulheres em espaços públicos. O resultado foi a criação de botões de emergência em celulares (os botões enviam uma mensagem ou fazem uma chamada telefónica para um contato de emergência, ou acionam a polícia ou hospitais). Também houve a criação de um aplicativo que indica os lugares mais seguros da cidade e podem enviar uma mensagem para alertar a polícia ou familiares e amigos.

Cairo – Egito

Foi realizado um seminário sobre a prevenção e resposta à violência baseada no gênero. Estudos de casos de todo o mundo árabe melhoraram a compreensão das abordagens estratégicas.

Em razão do seminário, foi criada uma lei que estabeleceu as primeiras punições para o assédio sexual.

Paralelamente, a ONU Mulheres ajudou o Conselho Nacional das Mulheres a desenvolver a Estratégia Nacional de Combate a Todas as Formas de Violência contra as Mulheres.

Guatemala – Guatemala

Na Cidade da Guatemala, o programa Cidade Segura apoiou a criação da lei contra o feminicídio e outras formas de violência contra as mulheres e a lei contra a violência sexual, exploração e tráfico de pessoas.

Foi recentemente criada uma Política Municipal de Desenvolvimento da Mulher, incluindo medidas para prevenir o assédio sexual em espaços públicos.

Port Moresby - Papua Nova Guiné

Em Papua, 80% dos vendedores nos mercados da capital são mulheres, todas dependem do rendimento dos produtos que vendem e enfrentam, no curso do seu dia de trabalho, assédio e múltiplas formas de violência.

Através do Programa Cidade Segura de Port Moresby, foram implementadas várias medidas para melhorar a segurança das mulheres durante o trabalho, dentre elas a formação de associações das mulheres vendedoras, as quais têm sido fundamentais na identificação de ameaças e no desenvolvimento de medidas para reduzir riscos.

O mercado de Gerehu, em Port Moresby, foi selecionado como o primeiro mercado do Programa Cidade Segura. Desde então, o programa renovou as bancas do mercado, forneceu água potável, melhorou o saneamento e os banheiros e construiu um parque infantil para as crianças que acompanham muitas mulheres vendedoras. A iluminação melhorou, e as vedações que isolavam zonas do mercado, tornando-as inseguras, foram removidas. Foram criados postos de polícia no local.

Foram implementadas, ainda, ferramentas de capacitação para as mulheres gerirem os seus negócios de forma mais eficiente.

A eficiência das medidas já é visível, em razão da redução da violência no mercado de Gerehu e as estratégias estão sendo implementadas em outros mercados da cidade.

Os resultados do programa também ajudaram a criar uma iniciativa no Pacífico chamada “Mercados para a Mudança”, centrado no reforço do poder econômico das mulheres nas Fiji, nas Ilhas Salomão e em Vanuatu.

Kigali – Ruanda:

Muitas vendedoras ambulantes da cidade não têm meios para ter um negócio formal e correm frequentemente um elevado risco de assédio sexual, violência e roubo enquanto vendem os seus produtos na rua.

Foi, então, criado o Minimercado Seguro para Mulheres onde 60 mulheres vendedoras ambulantes podem finalmente vender os seus produtos em segurança.  O novo mercado inclui creche e um espaço para as mães que amamentam.

Com cerca de 5.000 mulheres trabalhando como vendedoras de rua em Kigali, a cidade pretende criar mais minimercados, melhorar a situação financeira e proporcionar acesso a formação.

Délhi – Índia:

O programa “Delhi Safe City” criou um comitê que realiza reuniões periódicas para melhorar a coordenação entre os departamentos governamentais, o que produziu vários resultados.

Foram instaladas luzes em zonas mal iluminadas e foram introduzidas melhorias para assegurar uma presença visível da polícia nos espaços públicos.

O projeto “Delhi Transport Corporation” capacitou mais de 1.200 agentes que trabalham no transporte público a prevenir o assédio sexual.

Sakai – Japão:

Sakai tornou-se a primeira cidade do Japão a participar da iniciativa Cidades Seguras e Espaços Públicos Seguros.

A cidade instalou câmeras nos espaços urbanos, melhorou a iluminação das ruas e formou e mobilizou membros da comunidade para participarem ativamente do combate à violência.

 

Aqui no Brasil inúmeras ações interessantes foram implementadas, destaco a criação do Abrigo Amigo instalado em alguns pontos de ônibus recentemente. O projeto contempla a instalação de telas nos pontos de ônibus, nas quais os atendentes conversavam com mulheres, para lhes fazer companhia até seu ônibus chegar. Dessa forma, elas não ficariam totalmente sozinhas, naquele local, à noite.

A ideia representa uma excelente iniciativa que, aliada a inúmeras outras medidas, podem ajudar na garantia da segurança da mulher.

Através das experiências acima, fica claro que o combate à violência contra a mulher nos espaços públicos depende, especialmente, do diagnóstico do problema, levando em consideração as peculiaridades locais, do envolvimento da sociedade civil (especialmente das mulheres) na discussão sobre o tema, da revisão de leis e da implementação de políticas públicas que envolvem a capacitação de agentes públicos, a facilitação de canais de denúncia (além do estímulo à denúncia), a conscientização da sociedade, a zeladoria do espaço público, até a implementação de medidas que visem dar autonomia às mulheres.

Quem sabe um dia possamos caminhar pelas cidades do mundo em segurança.


[1] Disponível em: https://actionaid.org.br/wp-content/files_mf/1512135627DeQuemeaCidadeLow.pdf.

[2] Disponível em https://www.unwomen.org/sites/default/files/Headquarters/Attachments/Sections/Library/Publications/2017/Safe-Cities-and-Safe-Public-Spaces-Global-results-report-en.pdf

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