Comunicados
Resumidamente, o caso concreto trata da resilição de contrato de compra e venda de unidade autônoma, pelos adquirentes, os quais alegam que “foram surpreendidos com a alteração unilateral do projeto (ausência de edificação de varanda panorâmica), bem como, com o atraso injustificado da obra para todas as unidades, que excederam injustificadamente o prazo determinado pela própria ré, qual seja, mês de dezembro de 2015”. Referidos adquirentes, cientes da cessão dos créditos decorrentes de seu contrato para a Securitizadora, a incluíram no polo passivo da demanda de forma solidária à própria Incorporadora.
Mas, a Ministra Maria Isabel Gallotti, em decisão monocrática, de 19 de setembro de 2022, reconheceu a ilegitimidade passiva da Securitizadora, por entender que a operação de securitização que, neste caso, tem por base a cessão dos créditos imobiliários pela Incorporadora, deve ser analisada de forma independente da operação de compra e venda realizada anteriormente.
Ressalta-se, abaixo, alguns trechos do Acórdão da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, em sessão virtual de 07/06/2022 a 13/06/2022, que, por unanimidade, negou provimento ao recurso no âmbito do julgamento de caso análogo que buscava a responsabilização de FIDC, nos termos do voto da Ministra Maria Isabel Gallotti:
“Com efeito, destaco que é incontroverso que a parte recorrente não integrou a “cadeia de consumo”, visto que não participou em momento algum do fornecimento do objeto do contrato de compromisso de compra e venda de imóvel na planta, não tendo sequer prestado serviço acessório ao promissário comprador.
Nesse contexto, a tentativa de imputar à parte agravada práticas de “atos de gestão” por receber os pagamentos do agravante não torna controverso o fato de que o contrato de cessão/antecipação de créditos (securitização de recebíveis) é estranho ao contrato de promessa de compra e venda.
Isso porque a relação referente à cessão/antecipação de créditos (securitização de recebíveis) é firmada entre o cedente, credor originário, e o cessionário, credor “atual”, sendo devido ao cedido apenas notificação o comunicando para fins de torná-la eficaz e oponível a esse, conforme disposto no artigo 290 do diploma civil. (REsp 1726161/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 6/8/2019, DJe 3/9/2019)
Noutros termos, depreende-se que o objeto do contrato de cessão/antecipação de créditos é não somente estranho à relação consumerista e ao próprio objeto do contrato de promessa de compra de venda em debate, mas também posterior e independente, sendo incabível a responsabilização do recorrente pelo atraso na entrega do imóvel.
A manutenção do entendimento pretendido pelo agravante implicaria, por via transversa, a própria desconstituição do contrato regularmente firmado de antecipação de crédito firmado entre duas pessoas jurídicas, visto que a responsabilização solidária pela restituição dos valores invalidaria a alocação de riscos feita pelos participantes da operação, ínsita e essencial à natureza do contrato mencionado. (grifos nossos)”
Os pontos destacados acima também foram levantados pela Ministra Maria Isabel Gallotti em sua decisão monocrática e, acertadamente, reforçam o caráter autônomo das operações de securitização, que não se confundem com as atividades de fornecimento e/ou de prestação de serviços previstas no Código de Defesa do Consumidor, ainda que tenham entre elas alguma relação, trazendo maior segurança jurídica ao mercado de capitais e ao imobiliário, uma vez que, ao afastar a aplicação do CDC, a confiança do mercado e consequentemente, dos investidores em tais operações de securitização aumenta, já que a jurisprudência sobre o tema ainda é exígua. Assim, precedentes como estes, abrem caminho para que os tribunais e os juízes de primeira instância possam decidir de forma mais alinhada com as práticas e entendimentos do mercado.
São Paulo, 15 de dezembro de 2022.