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Fonte: Valor Econômico
TJ-SP muda de entendimento e deixa de aplicar determinação de editais
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) mudou de entendimento e tem livrado quem compra imóvel em leilão de quitar dívidas anteriores de IPTU, mesmo que o edital tenha previsão de pagamento. Há julgados nesse sentido nas três câmaras de direito público que julgam o assunto.
Em geral, nas aquisições via leilão judicial, a responsabilidade por dívidas de IPTU anteriores à arrematação segue o que está previsto no edital. Se constar que os débitos serão do arrematante, ele deverá fazer a quitação integral dos valores em aberto para poder prosseguir com a aquisição e averbação da transferência.
Julgados mais antigos do TJ-SP mantinham a previsão dos editais. Outros tribunais e mesmo o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm decisões nesse sentido. Porém, passou a prevalecer na Corte paulista o entendimento de que deve ser seguido o que estabelece o Código Tributário Nacional (CTN). Julgam nesse sentido a 14a, 15a e a 18a Câmaras de Direito Público.
O artigo 130, parágrafo único, do CTN determina que, nas aquisições por meio de leilão judicial, os débitos de IPTU subrogam-se no respectivo preço. Ou seja, o arrematante só deve desembolsar o valor do lance e nada mais.
“Os novos julgados do TJ-SP são importantes. Além de propiciarem uma economia tributária expressiva, validam uma tese que até então não era aceita pelos tribunais”, diz Bruno Sigaud, do Sigaud Advogados. “Praticamente todos os imóveis levados a leilão têm dívida de IPTU. A depender do imóvel, milionária. Há débitos de R$ 5 milhões, R$ 6 milhões.”
Na cidade de São Paulo, a dívida de IPTU chegou a R$ 5,5 bilhões nos últimos três anos (de 2018 a 2020), segundo a assessoria de imprensa da prefeitura. As alíquotas de IPTU variam entre os municípios, de 1% a 1,5% sobre o valor venal do imóvel, por ano. Em São Paulo, é de 1% para residências e 1,5% para outros tipos de imóveis.
Uma das decisões, da 18a Câmara de Direito Público do TJ-SP, favorece uma construtora que arrematou um imóvel em leilão. Em abril, os desembargadores negaram recurso apresentado pela Prefeitura de São Paulo e foram unânimes ao entender que a empresa não deveria responder pela dívida de IPTU (apelação no 1000782-30.2020.8.26.0053).
O relator do caso, desembargador Henrique Harris Júnior, afirma em seu voto que, “em que pese o artigo 686, IV, do CPC [Código de Processo Civil] apontar que o edital de hasta pública deverá conter a menção da existência de ônus que recai sobre o bem, o CTN veda expressamente que o arrematante arque com o débito tributário sub judice”.
Para o desembargador, “a arrematação tem o efeito de extinguir os ônus tributários que incidem sobre o imóvel arrematado”. E acrescenta: “Além disso, o CTN é lei especial em relação ao CPC e sobre ele prepondera”.
A 14a Câmara de Direito Público do TJ-SP também seguiu a mesma linha, em caso julgado em novembro de 2020 (apelação no 1014309-83.2019.8.26.0053). Por maioria dos votos, os desembargadores acolheram recurso de dois arrematantes de imóvel em leilão contra exigência da Prefeitura de São Paulo.
Segundo o relator do caso, Octavio Machado de Barros, “o arrematante recebe o imóvel livre e desembaraçado dos encargos fiscais devidos até a data da expedição da carta de arrematação, pois esta tem o efeito de extinguir tais ônus sobre o bem imóvel arrematado”.
Dois compradores de um imóvel também conseguiram decisão favorável, na 15a Câmara do TJ-SP. O IPTU é exigido pela Prefeitura de Praia Grande. No entendimento da relatora, desembargadora Silvana Malandrino Mollo, como o arrematante deve quitar o valor assumido em leilão, sem qualquer dívida tributária, “o seu preço é que deve garantir os créditos existentes e distribuídos com observância da anterioridade das penhoras”.
Eventuais credores, acrescenta a relatora, “‘devem buscar a satisfação de seus créditos junto ao preço obtido na hasta pública realizada, respeitada a ordem de preferência do artigo 186 do CTN” (apelação cível no 1000483-42.2020.8.26.047).
O advogado Marcelo Terra, coordenador do Conselho Jurídico da Presidência do Secovi-SP, sindicato que reúne empresas de compra, venda, locação e administração de imóveis, afirma que as decisões são importantes para investidores que buscam oportunidades de negócios, compradores particulares e empresas do setor imobiliário, que adquirem terrenos para investir. “O arrematante fica com a tranquilidade e a segurança jurídica de não ter surpresas”, diz.
É muito comum, acrescenta, haver previsões em edital para responsabilizar o arrematante pelas dívidas antigas de IPTU. “E quando um imóvel vai a leilão é porque realmente o proprietário está em situação difícil. Raramente é leiloado sem dívida de IPTU”, afirma Terra.
Em nota, a Prefeitura de São Paulo diz que “ está em concordância com o Superior Tribunal de Justiça que, em suas últimas decisões sobre o tema, deu sentido de que a previsão expressa em edital da responsabilidade tributária do arrematante pelos débitos de IPTU anteriores à arrematação não viola o artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional”. Procurada, a Prefeitura de Praia Grande não deu retornou até o fechamento da edição.