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A Lei do Regime Jurídico Emergencial e Transitório (Lei Federal nº. 14.010, de 10/6/2020, ou Lei do RJET), aguardada pela grande relevância no atual cenário econômico, altera relações jurídicas privadas enquanto durar a pandemia do Coronavírus (Covid-19) no Brasil, instituindo normas de caráter transitório e emergencial. Em relação àquele aprovado pelo Congresso e enviado para sanção presidencial, o texto final teve significativos vetos em matéria contratual e de locações, reduzindo substancialmente o alcance e efeitos da nova lei.
A Lei do RJET não traz alterações definitivas da legislação vigente, mas cria regras transitórias que permitem, em casos determinados, suspender temporariamente a aplicação de alguns dispositivos do ordenamento legal. Matérias falimentares e de recuperação judicial, tributárias e administrativas não foram incluídas no Projeto de Lei nº. 1.179, que se converteu na Lei do RJET, e seguem tratadas por outros projetos em tramitação no Congresso Nacional, como o PL 1397/2020, que trata de recuperação judicial, e o PL 675/2020, que suspende novas inscrições no cadastro negativo para casos de inadimplência registrados após 20/3/2020.
De forma bastante resumida, além de tratar de regime concorrencial e família e sucessões, a Lei do RJET traz as seguintes regras:
a. Termo inicial: para os fins e aplicação do texto legal, fixa como termo inicial dos eventos derivados da pandemia, a data de 20/3/2020, mesma data de publicação do Decreto Legislativo nº 6 (que reconhece a ocorrência do estado de calamidade pública).
b. Prazos prescricionais: os prazos prescricionais consideram-se impedidos ou suspensos (conforme o caso), a partir da data de vigência da lei, até 30/10/2020, o que será observado também em relação a prazos decadenciais.
Exceções: não se aplica essa regra enquanto perdurarem as hipóteses específicas de impedimento, suspensão e interrupção dos prazos prescricionais previstas no ordenamento jurídico nacional.
c. Assembleias virtuais: as pessoas jurídicas de direito privado poderão realizar assembleias gerais por meios eletrônicos, até 30/10/2020, independentemente de previsão em seus atos constitutivos, inclusive para destituição de administradores e alteração de Estatuto Social.
Objeto: qualquer matéria poderá ser deliberada nessas assembleias virtuais.
Forma de manifestação: os participantes poderão participar por qualquer meio eletrônico indicado, que assegure sua identificação e manifestação de voto, produzindo os mesmos efeitos legais de uma assinatura presencial.
Requisitos: garantia da identificação do participante e da segurança do voto.
Comentário adicional: a Lei do RJET permite a realização de assembleias virtuais por todas as pessoas jurídicas de direito privado, ainda que em caráter temporário. São pessoas jurídicas de direito privado as associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas, os partidos políticos e as empresas individuais de responsabilidade limitada – EIRELI. Encontra-se em vigor a Medida Provisória nº. 931, de 30/3/2020 (“MP 931”), que atualmente tramita em regime de urgência para sua conversão em lei. Assim como a Lei do RJET, a MP 931 possibilita a realização de assembleias virtuais, porém em caráter permanente e tão somente pelas sociedades anônimas, sociedades limitadas e cooperativas. Não trata a MP 931 das demais pessoas jurídicas, trazendo insegurança para estas que também estão obrigadas a realizar assembleias, mas seus atos constitutivos não preveem regras específicas para participação e voto à distância. Mesmo que por tempo limitado, a Lei do RJET veio garantir a essas pessoas o respaldo jurídico necessário, a fim de legitimar a realização de suas deliberações assembleares de forma virtual.
d. Consumidor: suspende até 30/10/2020, a aplicação do prazo de desistência (de sete dias, contado da assinatura ou do de recebimento) para a hipótese de delivery (entrega domiciliar), apenas para produto perecível ou de consumo imediato e medicamentos.
e. Condomínios edilícios: permite, em caráter emergencial, e até 30/10/2020, a realização de assembleias condominiais (inclusive para eleição e destituição de síndico, para aprovação de orçamento de despesas, contribuições e prestação de contas, e alteração do regimento interno) e respectiva votação, por meios virtuais, equiparando-se o voto dos condôminos à assinatura presencial. Caso não seja possível a realização de assembleia virtual, a lei estabeleceu que os mandatos dos síndicos vencidos após 20/3/2020 ficam prorrogados até 30/10/2020.
f. Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD - Lei Federal nº 13.709/18): a entrada em vigor da LGPD estava programada para agosto deste ano. Com as mudanças promovidas pela RJET, as sanções administrativas para tratamento irregular de dados pessoais somente poderão ser aplicadas a partir de 1º/8/2021. A questão não ficou totalmente resolvida, já que a Medida Provisória nº 959/2020, editada durante a tramitação do PL 1179, prorrogou a entrada em vigor da LGPD para maio de 2021. Ou seja: neste momento, há o seguinte escalonamento: a LGPD entrará em vigor em 3/5/2021, por força da MP nº. 959/2020, e as sanções administrativas somente poderão ser aplicadas a partir de 1º/8/2021, em decorrência da nova Lei. Contudo, o cenário ainda pode mudar, a depender da tramitação da MP no Congresso. A MP deve ser votada até o fim de agosto do corrente ano, caso contrário, caducará, entrando a LGPD automaticamente em vigor, com exceção dos artigos sobre sanções administrativas.
g. Usucapião: a partir da entrada em vigor da Lei, até 30/10/2020, ficam suspensos os prazos de aquisição da propriedade imobiliária ou mobiliária por usucapião, em qualquer de suas modalidades.