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Fonte: Consultor Jurídico
Em tempos em que parece ganhar força, enfim, a realização de uma profunda e efetiva reforma tributária, ainda somos surpreendidos por medidas abusivas, dia após dia, na arrecadação tributária. Uma, em especial, causa incômodo pelos reflexos que causa, ilegalmente, há quase cinco anos no estado de São Paulo.
Estamos falando da aplicação de multa no âmbito do Imposto sobre Transmissões Causa Mortis e Doação (ITCMD), incidente em sucessões que sejam formalizadas pela via extrajudicial, ou seja, por escritura pública.
A lei estadual que define as regras para recolhimento do ITCMD no estado de São Paulo é de 2000, anterior à criação do “inventário extrajudicial”, em 2007, e, por isso, é toda voltada para inventários e arrolamentos realizados perante o Judiciário, única hipótese à época. Por isso, prevê a aplicação de penalidade em duas situações.
A relevante aqui é aquela aplicada “no inventário e arrolamento que não for requerido dentro do prazo de 60 (sessenta) dias da abertura da sucessão”. No âmbito judicial, esse requerimento de que a lei trata nada mais é do que a distribuição de uma petição inicial pelos herdeiros, que pode ser extremamente simples a ponto de só comunicar a morte e informar que será procedido o inventário, com a apresentação de documentos e herdeiros futuramente.
Com a criação da modalidade extrajudicial, em 2007, o Fisco estadual passou, de imediato, a não aplicar essa multa para os inventários feitos por escritura. Isso porque estes são instrumentalizados em ato único e exigem não só o prévio recolhimento do imposto, como também a reunião de todos os documentos e informações necessários para a lavratura da escritura, como a certidão comprobatória de inexistência de testamento e, até mesmo, o consentimento dos herdeiros em relação à partilha a ser implementada. Ou seja, medidas que nem sempre são possíveis em apenas 60 dias.
O fato é que, em 2015, o Fisco paulista mudou de ideia e passou a aplicar a multa para as escrituras não lavradas dentro de 60 dias, criando enorme distinção de tratamento às duas modalidades de inventário.
Para solucionar esse problema, a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo editou o Provimento CGJ 55/2016, dispondo que “a nomeação de inventariante será considerada o termo inicial do procedimento de inventário extrajudicial”. Ou seja, para afastar a multa, nos inventários feitos por escritura pública, basta que os herdeiros façam uma escritura de nomeação de inventariante no prazo de 60 dias.
Problema resolvido, certo? Errado. Isso porque o sistema de preenchimento da declaração de ITCMD não reconhece essa possibilidade e aplica a multa, automaticamente, mesmo hoje, mais de três anos após a determinação da Corregedoria.
Assim, cabe ao contribuinte que, eventualmente, discordar da sua aplicação recorrer à via judicial para questionar a legalidade da multa. E o resultado todos sabemos: uma avalanche de mandados de segurança, com posicionamento pacífico de nossas cortes pela ilegalidade da multa.
Por isso, causa perplexidade a absoluta incapacidade do Fisco paulista de simplesmente adequar o seu sistema de arrecadação tributária, curvando-se ao posicionamento definido há três anos e ratificado por dezenas de decisões judiciais, para simplesmente permitir o recolhimento do tributo, sem multa, para os inventários por escritura em que tenha havido a nomeação de inventariante no prazo de 60 dias do óbito.
Agradeceríamos todos, advogados, contribuintes e certamente também o nosso Poder Judiciário, que se veriam livres de ações judiciais manifestamente desnecessárias.