Artigos
09 de janeiro de 2019
Fonte: O Estado de S. Paulo
Um dos primeiros atos do presidente eleito, uma medida provisória, trouxe a demarcação de terras indígenas para debaixo dos holofotes.
E sem aqui querer desmerecer a polêmica sobre quem deve ser o responsável pelas demarcações, é importante que não se perca a oportunidade que o momento permite para que sejam enfrentados os reais problemas que sempre afligem quem se vê envolvido com uma demarcação: falta de transparência no procedimento administrativo, laudos técnicos contaminados por vieses ideológicos dos mais variados, desrespeito a princípios constitucionais e critérios estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em julgamentos sobre o tema, enfim, uma série de fatores que trazem enorme insegurança jurídica a quem explora a atividade agrícola pelo interior do Brasil e que acaba levando o processo administrativo demarcatório, quase sempre, a ser questionado perante o Poder Judiciário.
A dívida brasileira com os povos indígenas, que ninguém duvide, é enorme, mas sua reparação não autoriza que se violem princípios constitucionais basilares durante o procedimento demarcatório o que, infelizmente, acontece com certa frequência, como bem sabe quem já teve algum contato com o assunto.
Não é incomum encontrarmos procedimentos que ignoram títulos de propriedade que remontam aos tempos do Império, ampliação de áreas demarcadas que extrapolam, e muito, as chamadas “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”, enfim, uma série de irregularidades que maculam várias demarcações.
Por isso que, mais importante do que o órgão responsável por elas, é a forma com que o procedimento será gerido, devendo pautar-se pela transparência e publicidade, além de respeitar critérios claros e objetivos, já definidos pela Constituição Federal (CF) e pelo STF (especialmente no que se refere ao marco temporal, que exige que as terras estivessem ocupadas pelos índios em 1988, quando da promulgação da CF).
Caso contrário, estejam as demarcações sob a batuta da Funai, do Ministério da Agricultura ou de qualquer outro órgão, pouco importa. Serão elas apenas uma etapa preliminar, cabendo quase sempre ao Judiciário, a palavra final sobre o tema.